Perigos na "Cabana". Não entrem
Perigos na "Cabana". Não entrem
Albert Mohler e Leonardo Galdino
Albert Mohler - A Cabana: O fim
do discernimento evangélico
O mundo editorial vê poucos livros alcançarem o
status de blockbuster, mas A Cabana, de William Paul Young já ultrapassou esse
ponto. O livro, originalmente auto-publicado por Young e mais dois amigos, já
vendeu mais de 10 milhões de cópias e foi traduzido para em mais de trinta
línguas. Já é um dos livros mais vendidos dois últimos tempos, e seus leitores
são muito entusiasmados.
De acordo com Young, o livro foi escrito
originalmente para seus filhos. Essencialmente, a história pode ser descrita
como uma teodicéia narrativa – uma tentativa de responder às questões sobre o
mal e o caráter de Deus por meio de uma história. Nessa história, o personagem
principal está enfrentando grande sofrimento após o seqüestro e homicídio
brutal de sua filha de sete anos, quando recebe um convite que se torna um
chamado de Deus para encontrá-lo na mesma cabana onde sua filha foi assassinada.
Na cabana, “Mack” se encontra com a divina
Trindade: “Papa”, uma mulher afro-americana; Jesus, um carpinteiro judeu; e
“Sarayu”, uma mulher asiática revelada como sendo o Espírito Santo. O livro é
na maior parte uma série de diálogos entre Mack, Papa, Jesus e Sarayu. Essas
conversas revelam um Deus bem diferente do Deus da Bíblia. “Papa” é alguém que
nunca faz algum julgamento e parece muito determinado em afirmar que toda a
humanidade já foi redimida.
A teologia de A Cabana não é incidental na história.
De fato, em muitos pontos a narrativa parece servir apenas como estrutura para
os diálogos. E os diálogos revelam uma teologia que é, no mínimo,
inconvencional e indubitavelmente herética sob alguns aspectos.
Enquanto o dispositivo literário de uma “trindade”
incomum das pessoas divinas é em si mesmo sub-bíblico e perigoso, as
explicações teológicas são piores. “Papa” fala a Mack sobre o momento em que as
três pessoas da Trindade “se manifestaram à existência humana como o Filho de
Deus”. Em lugar algum da Bíblia se fala sobre o Pai ou o Espírito vindo à
existência humana. A Cristologia do livro é semelhantemente confusa. “Papa” diz
a Mack que, mesmo Jesus sendo completamente Deus, “ele nunca dependeu de sua
natureza divina para fazer alguma coisa. Ele apenas viveu em relacionamento
comigo, vivendo da mesma maneira que eu desejo viver em relacionamento com
todos os seres humanos”. Quando Jesus curou cegos, “Ele o fez apenas como um
ser humano dependente e limitado, confiando em minha vida e meu poder
trabalhando nele e através dele. Jesus, como ser humano, não tinha poder algum
em si para curar qualquer pessoa”.
Há uma extensa confusão teológica para desbaratar
aí, mas é suficiente dizer que a igreja cristã tem lutado por séculos para ter
um entendimento fiel da Trindade para evitar exatamente esse tipo de confusão –
um entendimento que põe em risco a própria fé cristã.
Jesus diz a Mack que é “a melhor forma para
qualquer humano se relacionar com Papa ou Sarayu”. Não o único caminho, mas
apenas o melhor caminho.
Em outro capítulo, “Papa” corrige a teologia de
Mack ao afirmar “Eu não preciso punir as pessoas pelo pecado. O pecado é a
própria punição, te devorando por dentro. Não é meu propósito puni-lo; minha
alegria é curá-lo”. Sem dúvida alguma, o prazer de Deus está na expiação
alcançada pelo Filho. Entretanto, a Bíblia revela consistentemente que Deus é o
santo e correto Juiz, que irá de fato punir pecadores. A idéia de que o pecado
é meramente “a própria punição” se encaixa no conceito oriental de karma, não
no evangelho cristão.
O relacionamento do Pai com o Filho, revelado em
textos como João 17, é rejeitado em favor de uma igualdade absoluta de
autoridade entre as pessoas da Trindade. “Papa” explica que “nós não temos
nenhum conceito de autoridade final entre nós, apenas unidade”. Em um dos
parágrafos mais bizarros do livro, Jesus fala para Mack: “Papa está tão
submisso a mim como eu estou a ele, ou Sarayu a mim, ou Papa a ela. Submissão
não tem a ver com autoridade e não é obediência; tem a ver com relacionamentos
de amor e respeito. Na verdade, somos submissos a você da mesma forma”.
A submissão da trindade a um ser humano – ou a
todos os seres humanos – teorizada aqui é uma inovação teológica do tipo mais
extremo e perigoso. A essência da idolatria é a auto-adoração, e a idéia de que
a Trindade é submissa (de qualquer forma) à humanidade é indiscutivelmente
idólatra.
Os aspectos mais controversos da mensagem do livro
envolvem as questões de universalismo, redenção universal e reconciliação
total. Jesus diz a Mack: “Aqueles que me amam vêm de todos os sistemas
existentes. São Budistas ou Mórmons, Batistas ou Muçulmanos, Democratas,
Republicanos e muitos que não votam ou não fazem parte de qualquer reunião
dominical ou instituição religiosa”. Jesus acrescenta, “Eu não tenho nenhum
desejo de torná-los cristãos, mas apenas acompanhá-los em sua transformação em
filhos e filhas do meu Papa, em meus irmãos e irmãs, meus Amados”.
Mack faz então a pergunta óbvia – todos os caminhos
levam a Cristo? Jesus responde “muitos caminhos não levam a lugar algum. O que
significa que eu vou caminhar por qualquer caminho para te achar”.
Dado o contexto, é impossível não tirar conclusões
essencialmente universalistas ou inclusivistas sobre o pensamento de William
Young. “Papa” diz a Mack que ele está reconciliado com todo o mundo. Mack
questiona: “Todo o mundo? Você quer dizer aqueles que acreditam em você,
certo?”. “Papa” responde “O mundo inteiro, Mack”.
Tudo isso junto leva a algo muito parecido com a
doutrina da reconciliação proposta por Karl Barth. E mesmo que Wayne Jacobson,
colaborador de William Young, tenha lamentado que a “auto intitulada polícia
doutrinária” tenha acusado o livro de ensinar a reconciliação total, ele
reconhece que as primeiras versões dos manuscritos eram muito influenciadas
pelas convicções “parciais, na época” de Young na reconciliação total – o
ensino de que a cruz e a ressurreição de Cristo alcançaram uma reconciliação
unilateral de todos os pecadores (e toda a criação) com Deus.
James B. DeYoung, do Western Theological Seminary,
especialista em Novo Testamento que conhece William Young há anos, afirma que
Young aceita uma forma de “universalismo cristão”. A Cabana, ele afirma, “está
fundamentado na reconciliação universal”.
Mesmo quando Wayne Jacobson e outros reclamam
daqueles que identificam heresias em A Cabana, o fato é que a igreja Cristã
identificou explicitamente esses ensinamentos exatamente como são – heresia. A
questão óbvia é: Como é que tantos cristãos evangélicos parecem não apenas
serem atraídos para essa história, mas para a teologia apresentada na narrativa
– uma teologia que em muitos pontos conflita com as convicções evangélicas?
Observadores evangélicos não estão sozinhos nessa
questão. Escrevendo em The Chronicle of Higher Education (A Crônica da Alta
Educação N. T.), o professor Timothy Beal da Case Western University argumenta
que a popularidade de A Cabana sugere que os evangélicos talvez estejam mudando
sua teologia. Ele cita os “modelos metafóricos não bíblicos de Deus” do livro,
assim como o “não hierárquico” modelo da Trindade e, mais importante, “a
teologia da salvação universal”.
Beal afirma que nada dessa teologia é parte da
“teologia evangélica tradicional”, e então explica: “De fato, todas as três
estão enraizadas no discurso acadêmico radical e liberal dos anos 70 e 80 –
trabalho que influenciou profundamente a teologia da libertação e o feminismo
contemporâneo, mas, até agora, teve pouco impacto nas conjecturas teológicas
não acadêmicas, especialmente dentro do meio religioso tradicional”.
Ele então pergunta: “O que essas idéias teológicas
progressivas estão fazendo dentro desse fenômeno evangélico pop?”. Resposta:
“Poucos de nós sabemos, mas elas têm sido presentes nas margens liberais do
pensamento evangélico por décadas”. Agora, continua, A Cabana tem introduzido e
popularizado esses conceitos liberais mesmo em meio aos evangélicos
tradicionais.
Timothy Beal não pode ser considerado apenas um
“caçador de heresias” conservador. Ele está empolgado com a forma que essas
“idéias teológicas progressivas” estão “se infiltrando na cultura popular por
meio dA Cabana”.
De forma similar, escrevendo em Books & Culture
(Livros & Cultura N.T.), Katherine Jeffrey conclui que A Cabana “oferece
uma teodicéia pós-moderna e pós-bíblica”. Enquanto sua maior preocupação é o
lugar do livro “em um cenário literário cristão”, ela não pode evitar o debate
dessa mensagem teológica.
Ao avaliar o livro, deve manter-se em mente que A
Cabana é uma obra de ficção. Mas é também um argumento teológico, e isso não
pode ser negado. Um grande número de romances e obras de literatura notáveis
contém aberrações teológicas e até heresias. A questão crucial é se a aberração
doutrinária é apenas parte da história, ou é a mensagem da obra propriamente
dita. Quando se fala em A Cabana, o fato mais perturbante é que muitos leitores
são atraídos pela mensagem teológica do livro, e não enxergam como ela é conflitante
com a Bíblia em tantos pontos cruciais.
Tudo isso revela um fracasso desastroso do
discernimento evangélico. É difícil não concluir que o discernimento teológico
é agora uma arte perdida entre os evangélicos – e essa perda só pode levar à
catástrofe teológica.
A resposta não é banir A Cabana ou tirá-lo das mãos
dos leitores. Não devemos temer livros – devemos lê-los para respondê-los.
Precisamos desesperadamente de uma restauração teológica que só pode vir
através da prática do discernimento bíblico. Isso requer de nós identificarmos
os perigos doutrinários de A Cabana, para termos certeza. Mas nossa tarefa
verdadeira é reaproximar os evangélicos dos ensinos da Bíblia sobre essas
questões e cultivar um rearmamento doutrinário dos cristãos.
A Cabana é um alarme para o cristianismo
evangélico. É o que dizem afirmações como as de Timothy Beal. A popularidade
desse livro entre os evangélicos só pode ser explicada pela falta de
conhecimento teológico básico entre nós – uma falha no próprio entendimento do
Evangelho de Cristo. A perda trágica da arte do discernimento bíblico deve ser
assumida como uma perda desastrosa de conhecimento bíblico. Discernimento não
consegue sobreviver sem doutrina.
Por: Albert Mohler Jr ©. Website:albertmohler.com
Leonardo Galdino – Heresias
escondidas dentro de uma Cabana
O escritor canadense William Paul Young saiu do
anonimato para a fama ao publicar um livro que se tornaria, em muito pouco
tempo, um verdadeiro sucesso. Com mais de dois milhões de cópias vendidas e
status de best-seller, “A Cabana” tem cativado a mente de muitas pessoas
ao redor do mundo, especialmente/inclusive dos cristãos. Em linhas gerais, o
livro conta a história de Mackenzie Allen Phillips, o “Mack”, um pai de família
que encontra a Deus depois de ter sua filha caçula, Missy, raptada e
brutalmente assassinada por um maníaco assassino de crianças (um serial
killer). Cerca de três anos e meio depois do ocorrido, Deus, ou melhor,
“Papai”, manda uma carta para Mack marcando um encontro com ele exatamente na
cabana onde a polícia havia encontrado o vestido usado por Missy todo
encharcado de sangue. Mack, depois de lutas intensas consigo mesmo, resolve
aceitar o “encontro”, mesmo desconfiando de uma possível cilada do assassino de
sua filha. Ao chegar lá, Mack tem uma, ou melhor, três surpresas:
Deus lhe aparece na pessoa de uma mulher “negra enorme e sorridente” (pág. 73).
Logo depois aparecem o Espírito Santo, na pele de uma mulher asiática, chamada
Sarayu, e Jesus, um homem médio-oriental (hebreu, pra ser mais preciso) vestido
de calça jeans e camisa xadrez. A partir de então, Mack vai viver uma
inesquecível aventura ao lado dessa ilustre “Trindade”.
Qualquer cristão que tenha um mínimo de
conhecimento de História da Igreja saberá que A Cabana nada mais é do
que o ressurgimento de algumas das antigas heresias que tumultuaram a vida e o
andamento da Igreja Antiga, principalmente aquelas que envolviam questões sobre
a Trindade. Do ponto de vista teológico, o livro oscila entre heresias
implícitas e explícitas; do ponto de vista literário, entre frases de
efeito medíocres (quase sempre) e alguns poucos insights interessantes.
Seu enredo envolvente propõe-se a apanhar os desavisados.
Não sei qual foi a experiência eclesiástica do
autor de A Cabana, mas posso presumir que não foi das melhores. Torna-se
patente, em muitas partes do livro, o desprezo pela igreja e pela adoração
corporativa, ressaltando-se e a valorização da experiência pessoal, como bem
reza a cartilha pós-moderna.
[Mack] Percebeu que estava travado e que as orações
e os hinos dos domingos não serviam mais, se é que já haviam servido [...] Mack
estava farto de Deus e da religião, farto de todos os pequenos clubes sociais
religiosos que não pareciam fazer nenhuma diferença expressiva nem provocar
qualquer mudança real. Mack certamente desejava mais (pág. 54
– versão digital. Itálico meu).
Parece que a intenção inicial do livro não é a de
levar os leitores a uma nova perspectiva sobre a Trindade, e sim, que eles
desacreditem da Igreja como sendo a “coluna e baluarte da verdade” (1Tm 3.15) e
sigam atrás de outras alternativas de encontrar Deus. Em minha opinião, esse é
o maior perigo que o livro oferece.
Quando o assunto, finalmente, é a Trindade, A
Cabana traz à tona várias heresias antigas (não pretendo fazer comentários
exaustivos sobre todas elas). Como já disse anteriormente, Mack vai à cabana
encontrar Deus, que lhe aparece no corpo de uma mulher de pele negra. Logo de
cara, vemos a verdadeira alma do paganismo, a saber, materializar Deus
dando-lhe alguma forma física. Entendo perfeitamente que se trata de um romance
e, como tal, precisa de personagens para dar substância ao enredo. Mas, em se
tratando do Senhor Deus Todo-Poderoso, essa regra não deve ser aplicada em
hipótese alguma. É exatamente isso que Deus expressamente proíbe no Segundo
Mandamento (Ex 20.4-5). Jesus mesmo declarou que “Deus é Espírito” (Jo 4.24).
Não devemos emprestar a Deus as formas vãs e tolas que concebemos em nossas
mentes pecaminosas (cf. Rm 1).
Uma das antigas heresias às quais me referi há
pouco é o Patripassianismo, doutrina monarquianista[1] segundo a qual foi
o próprio Deus quem morreu na cruz, em vez de Jesus. Tertuliano combateu esse
ensino com bastante veemência. Quando, certa vez, ele disse que “o demônio tem
lutado contra a verdade de muitas maneiras, inclusive defendendo-a para melhor
destruí-la”, estava se referindo justamente a essa heresia, que estava sendo
largamente difundida por Práxeas. Ele continua dizendo que “Ele [o demônio]
defende a unidade de Deus, o onipotente criador do universo, com o fim
exclusivo de torná-la herética[2]”. Em uma passagem de A Cabana essa
heresia é claramente visível:
Papai não respondeu, apenas olhou para as mãos dos
dois. O olhar de Mack seguiu o dela, e pela primeira vez ele notou as
cicatrizes nos punhos da negra, como as que agora presumia que Jesus também
tinha nos dele. Ela permitiu que ele tocasse com ternura as cicatrizes,
marcas de furos fundos, e finalmente Mack ergueu os olhos para os dela (pág.
86. Itálico meu).
Embora Jesus seja Deus, sabemos que não foi Deus, o
Pai, quem morreu na cruz. Deus não tem as marcas dos pregos em seus punhos,
como A Cabana quer que acreditemos. Foi o Seu Filho quem foi
crucificado. No afã de ressaltar a unidade da Trindade, o Monarquianismo acabou
resumindo tudo a uma só pessoa. Em mais uma declaração claramente sabeliana[3],
“Papai” diz a Mack que “quando nós três penetramos na existência humana sob a
forma do Filho de Deus, nos tornamos totalmente humanos” (pág. 85). Mas não é
esse o ensino bíblico. A Palavra de Deus é bastante clara quando se refere ao
Pai, ao Filho e ao Espírito Santo como sendo Pessoas distintas que possuem uma
mesma essência (ver Mt 28.29; 2 Co 13.13; 1 Jo 5.7; 2 Jo 3). E o pior de tudo é
que, para confundir ainda mais o leitor, “Papai” desdiz tudo o que houvera dito
antes, dizendo que
Não somos três deuses e não estamos falando de um deus
com três atitudes, como um homem que é marido, pai e trabalhador. Sou um só
Deus e sou três pessoas, e cada uma das três é total e inteiramente o um (pág.
87).
Seria algo equivalente à “Metamorfose Ambulante”
proposta por Raul Seixas (“eu vou lhes dizer agora o oposto do que eu disse
antes”)? Será que dá pra confiar no “Deus” proposto por William P. Young?
Mas os problemas não param por aí. Como se não
bastasse, o livro também nega a divindade de Jesus. Em uma conversa entre Mack
e Papai, Mack pergunta:
— Mas… e todos os milagres? As curas? Ressuscitar
os mortos? Isso não prova que Jesus era Deus… você sabe, mais do que humano?
— Não, isso prova que Jesus é realmente humano.
[Papai continua...]
— Fez isso como um ser humano dependente e limitado
que confia na minha vida e no meu poder de trabalhar com ele e através dele.
Jesus, como ser humano, não tinha poder para curar ninguém (pág. 90).
Ora, o que temos aqui não é o velho Ebionismo, que
pregava que Jesus tornou-se Messias pelo Espírito Santo? Ou, ainda, o
Arianismo, que dizia que Jesus era um simples homem elevado a uma categoria
superior à dos demais seres humanos? O autor faz um divórcio entre a Humanidade
e a Divindade de Jesus quando diz que “Jesus, como ser humano, não tinha poder
para curar ninguém”, quando, na realidade, as duas naturezas de Cristo são
inseparáveis. Nas palavras de John Stott, “Jesus não é Deus disfarçado de homem
e nem um homem disfarçado de Deus”. Ele é Deus-Homem, como bem foi definido em
Calcedônia no ano de 451 d.C. E para dar mais ênfase ainda na humanidade de
Cristo, a personagem Jesus “deixara cair uma grande tigela com algum tipo de
massa ou molho no chão, e a coisa tinha se espalhado por toda parte” (pág. 95),
o que rendeu boas gargalhadas a Mack e Papai. Era só o que faltava: um Jesus
todo atrapalhado!
O livro prossegue no enredo seguindo a tônica do “o
importante é relacionar-se”. Nada de imposições, de regras. Amor pressupõe
liberdade. Baseado nesse pensamento o autor constrói, ou melhor, desconstrói a
questão da hierarquia na Trindade. É assim que “Jesus” define a questão:
Esta é a beleza que você vê no meu relacionamento
com Abba e Sarayu. Nós somos de fato submetidos uns aos outros, sempre fomos e
sempre seremos. Papai é tão submetida a mim quanto eu a ela, ou Sarayu a mim,
ou Papai a ela (pág. 129 – versão digital).
Sarayu, que personifica o Espírito Santo, diz que a
hierarquia não faria sentido entre a Trindade (pág. 112). Como é que fica,
então, frases como “Seja feita a vossa vontade”? Não havia uma submissão do Filho
ao Pai? Jesus disse que desceu do céu para ”fazer a vontade do Pai”(Jo
6.38). A Cabana não se coaduna com a Bíblia aqui.
Outro ponto que chama alguma atenção no livro é a
questão da onisciência de Deus. Apesar de em alguns pontos ela ser ressaltada
(págs. 81, 147, 148, 174, 192 e 206, e.g.), o livro parece bem confuso neste
aspecto. Nas páginas 129-130, por exemplo, Jesus diz que “é impossível ter
poder sobre o futuro, porque ele não é real, e jamais será”. Sophia, uma
personagem que representa a Sabedoria de Deus (Teosofismo?) diz que Deus não
pôde impedir a morte de Missy (pág. 151), e que tal tragédia “não foi nenhum
plano de Papai” (pág. 152). Entretanto, mais uma vez ele se contradiz, ao
afirmar que poderia ter impedido o que aconteceu a Missy (pág. 204). Os
leitores mais familiarizados com as tendências teológicas pós-modernas saberão
que isso se trata de Teísmo Aberto, uma doutrina que remonta ao
Socinianismo do século XVI. Segundo essa ideia, o futuro não pode ser
plenamente conhecido (nem mesmo por Deus!), pois depende das ações dos seres
humanos (chamados de “agentes livres”). Isso inclui também as tragédias
naturais (como o Tsunami, por exemplo). Se isso é verdade, como é que fica,
então, a questão do Dilúvio? E de Sodoma e Gomorra? Não foi o próprio Deus quem
orquestrou tudo? Não é justamente isso que Ele diz em Isaías 45.7 (“… faço a
paz e crio o mal”)? William P. Young parece não acreditar muito nisso.
A verdade do Evangelho é outra questão que está em
jogo em A Cabana. Como diria a máxima modernista, “tudo o que é sólido
desmancha-se no ar”. Nada de certezas, convicções. Papai mesmo é quem diz a
Mack que “a fé não cresce na casa da certeza” (pág. 176), declaração que faria
Brian McLaren e Ricardo Gondim babarem! Sarayu diz: “gosto demais da incerteza”
(pág. 190). Em outra ocasião Papai diz a Mack: “Quem quer adorar um Deus que
pode ser totalmente conhecido, hein? Não há muito mistério nisso” (págs. 85 e
86 – versão digital). E as farpas contra a igreja continuam. Jesus diz: “não
crio instituições” (pág. 166). Logo em seguida, numa declaração hilariante, ele
afirma categoricamente: “eu não sou cristão” (pág. 168). Aliás, para esse
Jesus, o evangelho não é exclusividade. Diante do pluralismo religioso “Jesus”
é bastante inclusivista. Ele mesmo diz que
Os que me amam estão em todos os sistemas que
existem. São budistas ou mórmons, batistas ou muçulmanos, democratas,
republicanos e muitos que não votam nem fazem parte de qualquer instituição
religiosa (pág. 168).
Realmente, para um Deus que disse que “a morte
dele [de Cristo] e sua ressurreição foram a razão pela qual eu agora
estou totalmente reconciliado com o mundo” (pág. 180 – itálico meu) isso
não é problema. Universalismo? Imagina! “Não preciso castigar as pessoas pelos
pecados” (pág. 109). “Em Jesus eu perdoei todos os humanos por seus pecados
contra mim, mas só alguns escolheram relacionar-se comigo”, disse Papai (pág.
209). Que estranho, não? Todo mundo perdoado e alguns que se relacionam? Bom,
se é ele quem está falando, quem sou eu para questionar? No meio de toda essa
confusão Mack parecia mesmo estar totalmente perdido. Foi “barrado” inclusive
de ter seu momento devocional, quando foi perguntar pelas orações, ouvindo da
boca de Papai: “nada é um ritual” (pág. 194). Coitadinho do Mack! Não tinha
razão em nada! Mesmo quando pensou em Jesus como referencial de vida, um
exemplo a ser seguido, ouviu da boca do próprio: “minha vida não se destinava a
tornar-se um exemplo a copiar” (pág. 136). E agora, José, ou melhor, Mack? Caía
por terra diante de seus olhos toda a instrução apostólica para que sejamos
“imitadores de Deus” (Ef 5.1; 1Pe 1.16).
Ainda não acabou. Falta o “filé mignon”. Que tal
uma pitadinha de Espiritismo para temperar nossa estória? Pois é. Mack vê sua
filha, Missy! Uau! Que emocionante, hein? Foi Sophia (uma médium?) quem
proporcionou esse encontro (pág. 153). E tem mais. Mack reencontra o seu pai
(pág. 200), que ele havia envenenado depois de ter levado uma surra que o
deixou de cama por duas semanas quando ele tinha apenas 13 anos de idade. Abre
parêntese. O pai de Mack era um alcoólatra que batia na esposa, e Mack contou
isso a um irmão da igreja da qual seu pai era membro. Fecha parêntese. Esse era
um segredo que Mack guardava a sete chaves. Realmente, ele tinha muitas feridas
que precisavam ser curadas. Então, por que não fazê-lo com uma sessão espírita?
Os dois se abraçaram e fizeram as pazes, com direito a beijinho na boca e tudo
(pág. 201). Jesus gosta tanto dessa ideia de beijar na boca que resolve fazer o
mesmo com Papai (pág. 205).
Perdoem-me aqueles que ainda não leram o livro,
pois revelei muitos dos seus suspenses. Achei por bem não expor
absolutamente tudo de errado que encontrei. Expus apenas aquilo que
considerei necessário. É perfeitamente compreensível o fato de A
Cabanaencabeçar o ranking dos livros mais vendidos[4], afinal de
contas as pessoas estão à procura de um “Deus” (deus!) que se ajuste às suas
pretensões. O que nos preocupa, entretanto, é saber que dentre os que financiam
esse tipo de heresia estão aqueles que se professam crentes em Cristo. Sei que
se trata de uma ficção, mas infelizmente não é dessa forma ela tem sido
encarada. Perguntado sobre o que ele quer que as pessoas concluam ao
lerem A Cabana, numa entrevista, William P. Young declarou que deseja que
as pessoas “saibam ou tenham a noção de que Deus é bem maior do que eles já
imaginaram”[5]. Lembrando de trechos do livro, sinceramente ainda não consigo
enxergar grandeza alguma no “Deus” apresentado por Young. O que vi foi uma
divindade deficiente que se curva aos caprichos humanos. Continuo preferindo o
Deus que se revelou nas Escrituras. Este sim é a minha Rocha!
“Se alguém vos prega evangelho que vá além
daquele que recebeste, seja anátema”! (Gl 1.9)
[1] O Monarquianismo, doutrina desenvolvida no
final do século II e início do III, enfatizava tanto a unidade de Deus que acabou
se transformando em numa espécie de Unitarismo, negando a realidade do Pai, do
Filho e do Espírito Santo como Pessoas distintas.
[2] Bettenson, H. Documentos da Igreja Cristã.
São Paulo, 2001. Editora Aste, Pág. 81.
[3] Sabélio ensinava que o Pai, o Filho e o
Espírito Santo são uma só e mesma essência, três nomes diferentes para a mesma
substância. “Deus se manifestou como Pai no Velho Testamento, depois como Filho
para redimir o homem e como Espírito após a ressurreição de Cristo. Não houve,
então, três pessoas em Deus mas três manifestações” (Earle E. Cairns. O
Cristianismo Através dos Séculos. São Paulo – SP, 1988. Editora Vida Nova,
Pág. 83).
ACHEI IMPORTANTE ESTA POSTAEGM SOBRE AS HERESIAS DO LIVRO "A CABANA", EMBORA O AUTOR ESTÁ CONFUSO SOBRE TEOLOGIA,MAS ELE INTECIONALFEZ OU NÃO ACABOU CRIANDO DOUTRINAS CONTRÁRIAS AS DA BÍBLIA. INFELIZMENTE AS LIVRARIAS EVANGÉLICAS QUEREM VENDER, QUE VENDEM NÃO IMPORTA. ANÍZIO
ResponderExcluir